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Luz para las cajas de zapatos

  • Foto do escritor: Letícia Garcia
    Letícia Garcia
  • 27 de out. de 2021
  • 2 min de leitura

Janelas são ótimas metáforas. Para os olhos, “janelas da alma”. Para a televisão, “janela para o mundo”. São enquadramentos, aberturas, espaços para ver — e ser visto. Deixam entrar a luz, o cheiro da chuva, o barulho da rua. Colocam as pessoas em contato. Podem ser fechadas, sim — mas estão ali para serem abertas.


Pois as janelas são centrais para o filme argentino “Medianeras” (2011), do diretor Gustavo Taretto. Com um pé no cinema universitário e outro na comédia romântica, a história acompanha a vida de Mariana (Pilar López de Ayala) e Martín (Javier Drolas) que vivem agora, na nossa contemporaneidade tecnológica. O filme se desenrola em Buenos Aires, mas poderia ser em qualquer metrópole, cheia de prédios e fios e gente e tempo que não pode ser perdido.


Nenhum deles tem vidas perfeitas, e, mais que isso, tem lá suas fobias. Vivem em cubículos — suas cajas de zapatos —, fechados, rodeados por vizinhos que não conhecem, cruzando diariamente com dezenas de pessoas sem saber quem elas são. São multidões solitárias. A linda fotografia do filme, cheia do concreto da cidade e suas formas, mostra os lugares. Os diálogos/pensamentos, cheios de poesia, mostram a vida que pulsa e se contorce entre paredes com pouca luz.


Aí chegamos às janelas. Na Argentina — descobri no filme —, medianera é o nome que se dá àquela parede lateral do edifício que faz divisa com um terreno, à espera da fatídica construção de outro prédio ao seu lado. Em Buenos Aires, é proibido ter janelas nessas laterais. O diretor parece querer deixar esse fato bem marcado, dada a iluminação taciturna no interior dos apartamentos.


Sem essas janelas, as vidas de Mariana e Martín, cada qual em sua caixa, não respiram ar fresco. Mais: a medianera parece impor à vida deles certo grau de escuridão, como que para mostrar as pessoas que não se veem, que mal veem (e acompanham) a vida que corre lá fora. E acabam se fechando também aos outros, afastando-se, presas entre quatro paredes, vendo a vida através das telas. Procurando enquadrá-la em outros quadros.


É quando Mariana e Martín resolvem abrir janelas nas suas respectivas medianeras. Bem assim, na clandestinidade, deixam entrar a luz. Olham e são vistos. As janelas que enchem o filme enchem-se de vida.


Num abrir de janelas, o encontro. Pode ser o encontro de si mesmo na janela do outro, mas, inevitavelmente, também o encontro com o outro. E, nas janelas, os prédios das cidades despem-se de concreto e passam a ser de carne e sonhos.

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Identidade visual por Cíntia Garcia. Orgulhosamente criado com o Wix.com

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