Como surgiu a cerveja
- Letícia Garcia
- 11 de out. de 2021
- 3 min de leitura
Matéria para a seção História da Revista da Cerveja, publicada em 2017.
“A cerveja é uma relíquia líquida da pré-história do homem, e suas origens estão fortemente entrelaçadas com as próprias origens da civilização”, afirma Tom Standage no livro “História do mundo em seis copos”. Milenar, a bebida acompanhou o desenvolvimento da humanidade desde a Idade da Pedra — alguns afirmam até que foi a grande responsável pelo fim do nomadismo e início do cultivo de grãos. O certo é que sua descoberta acidental deixou a história humana muito mais interessante.

A mais antiga evidência de cerveja está na Mesopotâmica, região do Crescente Fértil, no Oriente Próximo, localizada entre os rios Tigre e Eufrates — atual Iraque e partes de Irã, Kuwait e Turquia. O local de nascimento da bebida é também o berço da civilização.
O período em que a descoberta aconteceu já é mais difícil de ser determinado, isso porque as primeiras formas de escrita só foram aparecer por volta de 3,4 mil a.C. Mas considera-se que já existia por volta de 9 mil a.C., início do período Neolítico.
Em 4 mil a.C., sua produção já estava difundida — é desta época um pictograma mesopotâmico que mostra duas pessoas bebendo com canudo num grande jarro o que provavelmente era cerveja. Registros posteriores, especialmente do povo sumério e egípcio, dão uma ideia do desenvolvimento da bebida, da cultura associada a ela e de sua importância social, ritual e econômica.
Os grãos

A história indica que a cerveja não foi inventada, e sim descoberta pelos seres humanos pré-históricos. Isso porque seus processos estavam longe de fazer parte da vida nômade de um caçador-coletor. Mas os grãos já eram parte da alimentação desde muito tempo.
Na região do Crescente Fértil, eles brotavam selvagens e em grande quantidade. A forma mais comum de comê-los era esmagando e mergulhando em água, uma espécie de mingau que podia ou não ser aquecido com pedras quentes. Aconteceu de um recipiente cheio de grãos (tudo indica que uma cevada primitiva) ser deixado esquecido à céu aberto, talvez após uma farta coleta. Uma série de acontecimentos aleatórios, então, levou à cerveja.
Por acaso
Os caçadores-coletores naquele momento deviam ter mais a caçar e coletar, pois o recipiente ficou ao relento por um tempo. Uma chuva momentânea caiu e molhou os grãos, que germinaram. Pode ser que então alguém os tenha encontrado e resolvido fazer o mingau do mesmo jeito, aquecendo-o com pedras e tornando isso um líquido doce — pode ser que os grãos tenham ficado expostos por mais tempo e uma nova chuva tenha enchido o jarro, que depois recebeu alguma espécie de calor.
De uma forma ou de outra, a mistura surgiu, o amigo virou açúcar e tudo foi deixado novamente no jarro aberto, atraindo as leveduras selvagens do ar para um banquete. Voilà: fermentação. Assim, o mingau deixou de ser mingau, o açúcar foi convertido em álcool e gás carbônico e surgiu a primeira cerveja pré-histórica.
Este caldo, muito diferente da cerveja moderna, provavelmente com baixíssimo teor alcoólico, foi encontrado por seres humanos, que passaram a tentar reproduzir o feito acidental.
Base da civilização?
Armazenar grãos nutritivos, tendo comida para meses à frente, e cultivá-los em uma determinada região são comumente considerados os fatores que levaram o ser humano a se estabelecer em um só lugar. A chamada Revolução Agrícola, ou Revolução Neolítica, foi o marco que levou ao começo da civilização.
Os primeiros registros de agricultura estão no sítio arqueológico Godin Tepe (Turquia, que integrava a Mesopotâmia) e são de 9 mil a.C. Antropólogos mais ousados, porém, sugerem que a cerveja foi a grande razão para o início do cultivo de grãos — afirmam que ela trouxe uma crescente importância dos cereais para os grupos humanos, que sentiram necessidade de ter estes grãos necessários para a produção da bebida com alguma regularidade. [...]
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